quinta-feira, 25 de junho de 2009

Os enraizados

foto em Olhares
Somos feitos de sal, somos feitos de terra. Tão rudes, em pregas, em rugas. Nos pés: raízes e calos, nas mãos: ramos e cascas. Somos nós, feitos de mar. (Observo as gentes que passam: um homem carregando enxadas, outro percorrendo a estrada de bicicleta, lá ao fundo um tractor, e uma mulher levantando um pesado carrinho de mão com hortaliças – são todos velhos). Somos todos velhos. Nascemos com 1000 anos. Com a idade das pedras das igrejas. Mas, tal como as pedras, resistimos aos séculos. O homem tem mais força, a espinha mais robusta, os braços mais duros, que qualquer jovem de agora. A sua pele é já cabedal. Os olhos são mais pequenos e fechados, contra o vento e a chuva.

São os enraizados. Aprenderam, há muito tempo, a ser mais parecidos com as árvores que com as aves. Aprenderam a olhar para baixo, a ser escuros, mas, ainda assim, ser os grandes senhores desta terra. A tristeza não os deita abaixo, a solidão não os leva. Parecem aceitar todas as leis da vida como as leis da natureza. Como a chuva e o sol. E, de certa forma, isso parece conceder-lhes mais respeito do mundo que eu alguma vez possa receber.

Depois, vem a nossa geração, a seguinte: As gaivotas. Descolamos da terra e vivemos só para nós. Preocupamo-nos com todas as ninharias. Voamos bem alto, longe da realidade, apesar de acreditarmos que vemos mais. Somos todos, sempre, jovens. No entanto, por vezes, duvido da nossa força para enfrentar o mundo,

quando vejo aquela velhinha a passar na estrada, carregando um grosso fardo de hortaliças.

3 comentários:

Papoila disse...

Fez-me lembrar a ceifeira do Fernando Pessoa,

'Ah, poder ser tu, sendo eu !
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso ! Ó céu !
Ó campo ! Ó canção ! A ciência '

Primas disse...

tenho saudades da minha avó, dos meus avôs... sou omeu exemplo.

Anamaria Rossi disse...

Garota, estou encantada com a sua escrita.