terça-feira, 28 de abril de 2009

A meio...

Estocolmo


O dia de hoje pôs-se numa côr diferente de ontem. Em 24 horas a minha paleta tornou-se de meios tons. As cores dissolveram-se em branco para eu pintar um novo mundo, uma nova cidade, novas pessoas. Ou, simplesmente, a mesma cidade, mundo, pessoas, mas vistas a outra luz na minha vida. Em 24 horas voltámos a ocupar novos lugares no tabuleiro. Recomeçámos o jogo. E agora, entre a sorte e a perícia, resta-me jogar. Com a toda a arte e o sonho de quem acredita ganhar.

Ao som de: Antony and the Johnsons - The Lake

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Going to war?

Fazemos os nossos planos e crescemos...
Crescemos e fazemos os nossos planos...

Mas os planos de ontem não são já iguais aos de hoje.

Ser artista de rua...
bailarina
pintora
poeta...

Os planos de hoje passam por ser gestora de uma empresa de engenheiros nos arredores de Lisboa...

Podemos aceitar outro rumo e ainda assim sermos fiéis aos nossos sonhos?

Em tempos mais difíceis... ir à guerra?

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Trocar o certo pelo incerto

Viagem Malmo-Estocolmo com Isabelle: origamami, mapas, papelinhos...


... tinha sido a minha vontade desde sempre. Arriscar.


Trocar o certo pelo incerto...
o estável pelo inconstante,
o calmo pelo desafiante,
o tranquilo pelo aliciante,
a serenidade pela emoção,
o realismo pelo impressionismo,
os números pelos instintos,
as raízes pelas asas,
a cabeça pelo coração...

E hoje surge-me a dúvida de novo, bem de frente a mim.


Mas desta vez, perante a escolha, como nos últimos tempos, pondero pelo certo.

... estarei a envelhecer?

... ou estarei, temporariamente, desiludida com o mundo?



Ao som de: "Camera obscura: Tears for affairs"

terça-feira, 14 de abril de 2009

Vidas alternativas

Bonequeiro
Disse que se chamava Carlos. Esse nome tão simples como a sua expressão, como os olhos sorridentes e as roupas que vestia. Talvez tenha sido com essa simplicidade que também se deu a conhecer, que se aproximou apenas por isso, por falar. Numa amizade instantânea. E foi entre passos de forró e samba que se foram trocando estórias. Porque afinal estávamos no Brasil, e fazia calor, e dançava-se, até cair, até depois de cansar, já que depois do cansaço vem uma alegria inesgotável. E aí è tempo de continuar, continuar com as conversas, com os risos, com os encontros, deixando-nos levar, efémeros, como vento. Por entre gente e mais gente. Encontrar pessoas do mundo, holandeses, argentinos, um alemão que viveu em Manaus e fala “brasileiro” que se junta aos nossos passos até chegarmos a um pequeno bar hippie, de palha, chamado “fortaleza do Cachorro da Mão Quebrada” onde fomos enfeitiçados com a voz suave de uma linda rapariga argentina a cantar o reggae mais envolvente que já ouvi, até o sol nascer, sentados no chão.

Mais encantadora terá sido a sua história: há 11 anos atrás deixou a sua terra natal, Bogotá, Colômbia, e partiu. De bicicleta. A América do Sul, 11 anos, 20.000 quilómetros. Do mundo, não pediu sofregamente: O dinheiro para viver, muito conhecimento. Tentativas de viver uma vida “normal”, informática e psicologia. Mas de novo arrastado para lutas sociais, o “movimento dos sem terra”, o teatro de bonecas que fazia pelas cidades, mais tarde abandonado, e, porque são mais leves, os brincos e anéis que passou a vender de praia em praia.

Foi com ele que soubemos que a Punta del Este, no Uruguai, é um dos melhores locais para vender artesanato, que se dança mais tango no Brasil que na Argentina, que música oficial do estado do Maranhão é o reggae, que com o pico de inflação Argentina se criou um mercado sem Moeda em Buenos Aires, onde tudo funcionava por trocas e operaram as leis mais primordiais da economia, e que há comunidades no Brasil deliberadamente isoladas, onde os habitantes se recusam a viver com ligações à civilização, nem mesmo medicamentos, onde as crianças podem morrer de constipação, e que, todos os anos, todas as comunidades se encontram num grande evento no Brasil, a ENCA (Encontro Nacional de Comunidades Alternativas), e que é tão fácil apenas ir, apenas chegar. Que é só isso. E sem sair do chão, acabámos por viajar por lugares tão belos e místicos como o seu nome: Jericoacara, Paraty, Bogotá… E já não sei se quero partir, se quero ficar, se quero fugir…

Mas, com a mesma simplicidade, ele lá partiu na sua bicicleta, para um dia reaparecer da mesma forma numa rua de Barcelona, de Milão, de Ljubljana, de Évora, ou qualquer estrada ou monte até todos perderem o nome e serem só parte de um mundo que não é América, não é Ásia, e é apenas a mesma memória de uma grande estrada que se conhece do princípio ao fim.


Bookshop
Depois de algum tempo passar, porque o tempo não interessa ali, ali tudo é eterno como as palavras e as obras, lá nos olhou de novo. Com a frase à porta dizendo “O difícil é aprender a ler, o resto está escrito”, substituindo um antigo “Na dúvida, não entre” não fingia o seu desinteresse pela opinião dos outros. Ela vive apenas para as palavras. O Napolitano já tinha resolvido sair e parar de se gabar dos seus intelectualismo e bom gosto literário e deu-nos oportunidade de falar um pouco com ela. Tivemos sorte porque gostou de nós. E sei que gostou porque não nos respondeu torto, como não teria qualquer problema em fazer, se achasse que a estaríamos a empatar. Tirei-lhe umas fotos à livraria para oferecer à Paula. Eu sei que, se ela realizasse o seu sonho de abrir uma livraria feminista, sairia algo assim. Agora só falta mandá-las no correio para a Suécia.

Orgulhosa, contou a sua história. “Cheguei a Pipa apenas com 10 livros, há 10 anos, tudo o que tenho ou foi dado, ou trocado”. E hoje tem uma livraria lindíssima num dos recantos da vila. Vive lá, num sofá, com sua gata, que não está habituada ao carinho. Os livros, podemos alugar, comprar trocar, ou negociar.

“Visita o meu blogue” Disse ela, orgulhosa. Fiz um filme do incêndio que tivemos na livraria. Chama-se “arte em chamas”. E riu-se, da ironia do título.

10 reais cada livro. Escolhi dois. Ma só depois percebi que só tinha dinheiro para pagar um. “Está louca? Leva os dois livros sim. Depois me paga.” “Mas eu só devo volto daqui a um ano!”, “Não faz mal, depois traz-me um Livro.”

Estrela
O seu amigo tinha apanhado um peixe gato gigante: um homem de rastas e orelhas furadas. Na areia escaldante e peixe morto na mão. Aproveitou a deixa do nosso olhar para nos mostrar a sua arte. “Nós não temos dinheiro. Isto é tudo o que temos: 30 cêntimos”. E quase a cantar, nos largou uma lengalenga.

"Então eu vou fazer algo para vocês. Eu sou do Chile e sou vagabundo. Corro o mundo só eu e eu. Para nunca mandarem no que está cá dentro (apontou para a cabeça). Tinham coragem de largar assim, largar tudo? (fez uma estrelinha em arame em três tempos). Quando olharem para isto, olhem para o céu e procurem a estrela mais brilhante. E aí lembrem-se de não ter medo de seguir os vossos sonhos. "

E deixou-nos as estrelinhas, pegou na moeda, e seguiu com o seu amigo e o peixe gato, descalços, pelos caminhos da praia.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Les nomades

Vista do barco, Oslo

Seremos nómadas?

"Tudo isso para que Marco Polo pudesse explicar ou imaginar explicar ou ser imaginado explicando ou finalmente conseguir explicar a si mesmo que aquilo que ele procurava estava diante de si, e, mesmo que se tratasse do passado, era um passado que mudava à medida que ele prosseguia a sua viagem, porque o passado do viajante muda de acordo com o itinerário realizado, não o passado recente ao qual cada dia que passa acrescenta um dia, mas um passado mais remoto. Ao chegar a uma nova cidade, o viajante reencontra um passado que não lembrava existir: a surpresa daquilo que você deixou de ser ou deixou de possuir revela-se nos lugares estranhos, não nos conhecidos.

Marco entra numa cidade; vê alguém numa praça que vive uma vida ou um instante que poderiam ser seus; ele podia estar no lugar daquele homem se tivesse parado no tempo tanto tempo atrás, ou então se tanto tempo atrás numa encruzilhada tivesse tomado uma estrada em vez de outra e depois de uma longa viagem se encontrasse no lugar daquele homem e naquela praça. Agora, desse passado real ou hipotético, ele está excluído; não pode parar; deve prosseguir até uma outra cidade em que outro passado aguarda por ele, ou algo que talvez fosse um um possível futuro e que agora é o presente de outra pessoa. Os futuros não realizados são apenas ramos do passado: ramos secos."


Ítalo Calvino - Cidades Invisíveis

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Suave coisa nenhuma

Desapareci.

Por uns tempos, saí no vento. Vim parar ao lado esquerdo do mundo. Umas últimas férias (será?) para quem passou o ano a correr o globo. Acabo aqui, de chinelo no pé e areia no cabelo.

Suco de acerola, cajá, "melância".
A cidade deserta do calor que estala, que sua.
Poeira vermelha que se levanta nas estradas.
E gente que dorme em colchões no alpendre, do calor que derrete a casa.
Portas abertas e um sambinha que abraça,
assim como os sorrisos
e os olhares que nos reconhecem.
A alegria de ser acarinhada sem esforço.
De viver sem horas,

ao ritmo das marés.

E muitos dias para gastar,
iguais ao ontem mas, ...mas felizes.


(em Pipa)

Ao som de - Secos e molhados - Amor (Conselho da Mariana)